Valeu um político qualquer fazer graça perante os jornalistas para a muitos de nós vir à mente o poema de um dos heterónimos de Fernando Pessoa.
O Jorge publicou-o no seu blog e de certo modo induziu este meu post.
Aqui vai primeiro o poema e depois a reflexão.
Todas as cartas de amor
Não seriam cartas de amor se não fossem são
Ridículas.
Todas as cartas de amor são Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Álvaro de Campos, 21/10/1935
Tenho um saco cheio delas! De que tamanho é o saco? É um saco de supermercado que está algures num lugar de sótão... Umas, mais de dois anos delas, foram e vieram para e da Guiné-Bissau e destas algumas postas lá na fronteira com o Senegal; outras têm o carimbo da Irlanda do Norte metidas numa qualquer "post box" em Kill Route; outras ainda com selo da Índia embora em menor número... Entre elas algumas serão das que o autor refere mas todas as outras, ao sentimento subjacente estão as preocupações do dia a dia e os projetos de futuro, as gracinhas da filha então nascida...
Na altura o computador nem era ainda uma miragem nas nossas vidas... o papel e o envelope, a caneta e o selo e o ir ao marco do correio resumem-se hoje num premir rápido de teclas e um click final! Se assim fosse partes importantes das nossas vidas não estariam ali, num saco plástico, atadas por um cordel... Ter-se-iam sim perdido num qualquer disco rígido de um computador, nesta altura já desmantelado algures numa reciclagem qualquer!
Para que servem elas ali ? Não sei...